outubro 15, 2013

Espécie: Português (I)

Espécie internacionalmente reconhecida desde 1143, o Português ainda hoje suscita grande curiosidade, sobretudo pela sua aparente calma perante desastres de vária ordem.
O Português considera-se bem-falante, astuto, inteligente e, de algum modo, superior às restantes espécies da família dos humanos. Pesquisas revelam, todavia, que o Português é manso, invejoso e comodista. Mede o seu bem-estar por comparação ao bem-estar dos outros, manifestando particular felicidade quando os seus semelhantes estão na m*rda. Do mesmo modo, tendo por riqueza toda e qualquer acumulação de bens materiais a que pode, ou não, dar o devido uso, verifica-se que os seus objectivos de vida passam por ter uma casa maior e mais vistosa do que a do vizinho, um carro com maior cilindrada e mais recente do que o do vizinho, um iPhone, um iPad e gadgets semelhantes, que usa com orgulho em locais públicos. Gosta de roupas “de marca”, nem que, para as obter, tenha de fazer o grande sacrifício de procurar locais de contrafacção, correndo toda uma série de riscos para lá chegar, incluindo desrespeitar limites de velocidade e usar o telemóvel enquanto conduz, o que, facilmente, nos levaria a caracterizá-lo como corajoso.
O Português considera-se culto. As suas fontes de cultura são, porém, diferentes das de outras espécies humanas. De fácil entretenimento, o Português gosta de passar horas a observar a vida dos outros. Noutros tempos, fazia-o à janela e disso falava nas esquinas, com outros membros da mesma espécie. Nos tempos que correm, prefere fazê-lo nas redes sociais ou através de programas televisivos, que lhe trazem imagens da vida de gente que o Português nunca conheceu, nem nunca conhecerá, mas que lhe proporciona alguns momentos hilariantes.
No seu ambiente mais próximo, o Português é bastante preocupado com os que o rodeiam, chegando a saber mais das suas vidas do que da própria. Mas sempre com a melhor das intenções, visto que o Português nunca faz as coisas por mal. É também o que se designa como bom treinador de bancada - ou do sofá: ele, que está de fora, vê sempre tudo de outro modo e tem a certeza que, se fosse ele, faria tudo diferente e, obviamente, mil vezes melhor! Aliás, o Português é uma espécie que tem muita necessidade de falar, mesmo do que não sabe, acabando por cair, com frequência, numa diarreia verbal sem sentido, ao ponto de, a dado momento, nem ele perceber muito bem aquilo que quer nem aquilo que diz. Estas diarreias manifestam-se, sobretudo, no que diz respeito ao futebol e à política. Relativamente a esta, o Português revela uma inteligência fora do comum, pois nunca é o responsável pelas más escolhas eleitorais. Este hábito de culpar sempre os outros é, de resto, uma característica tão enraizada que até os governantes o fazem.

O Português gosta de se gabar, principalmente de tudo o que nunca fez, nem nunca faria ou fará. A sua capacidade para imaginar cenários alternativos, contudo, é tal, que o faz com uma destreza inigualável. O Português típico existe em todos os cantos e recantos de Portugal - e do mundo - e todos conhecemos, pelo menos, um espécime. Felizmente, a espécie tem também alguns bons exemplares, que, remando contra a maré, ainda acreditam que podem mudar rumos e mentalidades. Queira o Português típico que nunca assim deixe de ser. De outra forma, lá se vai a sua sorte. 

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